Saturday, April 02, 2005

Grécia Parte II - Atenas

No meu último post falei um pouco sobre Atenas. Nesse aqui vou extender meus comentários e falar um pouco mais sobre a cidade, já que Atenas é um padrão helênico, uma marca de importância-mor, além de ser capital do país.

Gregos festejando! | Free Image Hosting at www.ImageShack.usAtenas é grande. Tanto em população como em tamanho físico (expansão da cidade). São muitos os bairros, as áreas, as vistas, as sensações. Eu moro num bairro chamado Ilíssia, cujo nome provém do famoso rio Ílisso, que cruza a Ática (região territorial onde Atenas se localiza). Esse bairro, por sua vez, encontra-se no Demos chamado Zografo.

O Demos é coisa antiga, vindo da Velha Grécia, coisa inventada há mais de 3.000 anos. A palavra é a raiz de "população", ou seja: algo como "povo". Inicialmente, na Grécia Antiga, não existia essa idéia de coalição, de unidade territorial que nós temos (e que eles têm, também) hoje. À época o que havia eram dezenas - ou centenas - de cidades (ou melhor, povoados ou demoi [plural de "demos"]) localizadas em áreas relativamente conjuntas. O país só foi tomar consciência de que existia determinada unidade política quando os gregos resolveram celebrar a existência de Zeus, Deus Pai, com jogos em sua homenagem, a tomarem lugar em MetrôOlímpia, cidade no Peloponeso. Esses jogos levaram o nome da cidade em que eram sediados, sendo chamados Jogos Olímpicos, terminando por ganhar o adjetivo "panelênico". Veja bem: "jogos panelênicos". Os termos "Pan", palavra grega para "tudo" ou "todos", e "helênicos", termo grego para "gregos" (a Grécia, em grego, chama-se Hellas ou Hellada - com o passar do tempo, o H caiu em grego, mas continuou sendo mantido nas outras línguas devido à influência do latim, que, diferentemente do grego, manteve o H mesmo quando não era pronunciado), mostram que os jogos incluíam todos aqueles que constituíam, em essência, o mundo grego. As primeiras Olimpíadas tiveram lugar no ano 776 a.C., e eram disputadas aproximadamente a cada 4 anos.

Mas voltando ao lugar onde moro, "Zografo" é uma palavra grega para "pintura", e o Demos hoje em dia se relaciona melhor à palavra "distrito", que é um tanto incomum no Brasil (basicamente não se usa, a não ser para se referir ao Distrito Federal) , mas que na França, por exemplo, é um termo de uso corrente.

Parlamento Grego. | Free Image Hosting at www.ImageShack.usIlíssia localiza-se relativamente perto do centro (15 minutos de ônibus, ou 3 minutos de metrô). A parte principal do centro é um bairro chamado Syntagma, palavra grega para "constituição" - o lugar levou o nome devido à praça onde se formou a constituição da Grécia Moderna, ao fim do Império Otomano (um dos impérios mais cruéis da história, obtendo domínio sobre a Grécia por 400 anos - quase a idade do próprio Brasil!). Ali também se encontram o prédio do parlamento grego e a estação de metrô Syntagma (que tem conexões entre todas as linhas de metrô), além da supracitada praça Syntagma, hoje ponto de encontro de muita gente.

Seguindo em frente, temos o bairro "Omônia", uma palavra grega de difícil tradução. Geralmente as palavras que melhor se adequam a ela na língua portuguesa são "concórdia", "coalescência" e "união", unidas à palavra "paz". A melhor maneira de definir "Omônia" é pedindo que se imagine um círculo de pessoas, onde todos dão-se as mãos, ao mesmo tempo em que estão felizes e irradiam muita paz e muito amor. Isso é exatamente o que a palavra significa.

Omônia | Free Image Hosting at www.ImageShack.usNo entando, esse é um dos maiores paradoxos. "Omônia" é mais ou menos como o bairro Comércio em Salvador. É um lugar mais pobre e, de certa forma, perigoso. Para padrões europeus, é claro. Pra quem vive no Brasil ou na América Latina é coisa normal e corriqueira. Aqui nem ao menos existem pivetes de rua ou aqueles moleques que lavam o parabrisa dos carros no semáforo. Uns poucos mendigos ali, uns drogados cá, e, sim, uns poucos garotos que pedem esmola. Mas é muito difícil passar disso. A Grécia, mesmo sendo considerada um país relativamente pobre em relação a outras potências européias (como a Alemanha, por exemplo, que tem uma moeda firme como rocha) ainda está muito longe da situação brasileira.

Vista interna do Museu. | Free Image Hosting at www.ImageShack.usUm lance que eu curto aqui em Atenas é o fato de que as estações de metrô são sempre museus. É, parece estranho, mas é verdade. E há uma explicação bastante fácil: o que rola é que pra se fazer um metrô, logicamente há que se escavar (fundo) a terra para construir os túneis etc. Quando isso acontece as construções são sempre interrompidas pelo simples fato de que onde quer que escavem, sempre são achados artefatos arqueológicos. E aí vêm os arqueólogos, isolam a área, estudam os materiais, o sítio, pesquisam, recolhem tudo e só então se é possível continuar com o projeto subterrâneo do metrô. Depois de todo esse tempo, quando as estações são construídas, o governo coloca à mostra, nos corredores, parte dos achados que foram descobertos no local, e todo mundo pode ver. É interessante.

Pra terminar esse post, não poderia deixar de faltar a história da cidade. Se você ainda não percebeu, os nomes Atenas (cidade) e Atena (deusa) são bem parecidos. Não é por acaso. Na antigüidade os diferentes povos geralmente adotavam uma divindade como patrono (protetor) da cidade em que viviam. Em troca dessa proteção, os habitantes ofereciam libações, sacrifícios e oferendas ao(s) deus(es) protetor(es). No caso de Atenas, quando começou a ser vista como um demo (uma sociedade), viram que precisavam escolher um deus protetor. Até aí é história. O que vem a seguir é mitologia: de acordo com a lenda, o povo da cidade não sabia se deveria optar por Poseidon (Netuno, na mitologia romana) ou Atena (Minerva, na mitologia Romana) como patrono do povoado. Foi aí que os dois deuses resolveram se engajar numa batalha, de modos que o vencedor sairia como adorado dos habitantes.

A batalha tinha caráter pacífico, sendo mais um teste utilitário - para que o povo pudesse ver o que ganharia com a proteção do deus - do que uma guerra bélica. Poseidon, deus dos mares, tomou a iniciativa: fincou seu tridente no solo, e dali água jorrou abundatemente. A população não poderia estar mais contente; afinal, viviam a uma distância considerável de qualquer contato com água. E logicamente a água é um elemento vital para qualquer ser vivo nesse planeta. Poseidon estava confiante!

Contudo, uma tragédia entrou em curso: os habitantes, ao se utilizarem da água provida pelo deus, notaram que era perigoso bebê-la, pois as árvores com cuja água haviam irrigado haviam perecido, e os animais que dela haviam bebido estavam mortos. Só então descobriram a causa: a água oferecida era a do mar, e salgada como tal. Não era possível usá-la na agricultura ou pecuária.

Deusa Atena. | Free Image Hosting at www.ImageShack.usAtena, de esperanças renovadas, resolveu dar aos habitantes uma plantinha, que terminou por crescer e transformou-se na oliveira. A descoberta foi de extrema importância, pois aquele povo percebeu que as utilidades das olivas eram intermináveis: ela poderia ser usada na alimentação humana e pecuária, o óleo podia proteger a pele e cuidar de certos ferimentos, e auxiliava até mesmo no processo de construção de casas (mais ou menos como se usava óleo de baleia para construir muralhas durante o descobrimento do Brasil), entre uma infinidade de outras propriedades. Não deu outra: elegeram Atena como entidade protetora do vilarejo e nomearam a cidade com base no próprio nome da deusa (como era de costume na antigüidade).

A batalha não poderia deixar de ser documentada, e o Parthenon acabou exibindo a luta em seu pedimento ocidental.

Pedimento do Parthenon mostrando a batalha entre Atena e Poseidon. | Free Image Hosting at www.ImageShack.us





Palavras do dia:

  • Αθηνά (pronunciada "Athiná"), que significa [a deusa] Atena; e
  • Αθήνα (pronunciada "Athína"), que significa [a cidade] Atenas